Olha que emocionante. Ontem eu estava voltando da casa da Beibe, por volta dazonze da noite. Mentira, dazonzequarentacinco. Desci na praça sete. Se você tiver uma foto de BH, vai identificar a praça sete pelo monumento em forma de pirulito. Aquela coisa feia. Igual àquele monumento que tem em algum lugar em São Paulo e que eu sempre passava em frente quando eu era miúdo. Enfim, eu estava perto da praça sete e um rapaz decidiu que iria me assaltar. E me assaltou. E levou o meu celular, aquele que parece um sabonete. E eu comecei a correr pra lá e pra cá. Eu ia pra direita quando devia ter ido pra esquerda e fui pra esquerda quando deveria ter ido pra direita. Teria sido engraçado se tivessem me assaltado de novo nessa hora. Mas não me assaltaram, talvez porque ninguém acreditaria na história de dois assaltos seguidos. Embora eu desconfie que o senso de humor de Deus seja raso. Quando eu estava no auge da agitação, decidi que deveria fazer o coração da Beibe começar a paplitar também e liguei pra ela, Beibe, fui assaltado, o que eu faço. Corre atrás do bandido, Bucho. Troquei minha roupa de Don Juan pela do Zorro e fui atrás do Bandido. Pedi ajuda a uns policiais que não estavam comendo donuts (mas um deles estava com a mão suja de açúcar granulado. Desconfiei.). Eles me levaram para um tour pelo centro da cidade em busca do larápio, que naquele momento provavelmente organizava uma rebelião usando o meu celular. Durante o passeio, o guia, Soldado Ramos, mais conhecido como Vira à direita na Tamoios, Pedrão, me apontava os lugares mais importantes do maravilhoso mundo do centrão: O local de venda de celulares roubados, o local de prostituição, o local de venda de drogas, o baile funk da rua caetés. Conheci todo o caminho que um celular faz após ser roubado. O outro policial, não identificado, me contou tudo com detalhes e até mostrou quem faz o quê. Não confiem em caras de quarentas anos com bigode e camisa florida, esses é que fazem as encomendam e são os mais inescrupulosos. Os de vinte e cinco anos e bermuda só ficam na aba. São uns parias entre os parias. Não confiem neles também. Em nenhum momento eu pensei que eles poderiam me levar para algum matagal e me matar sem motivo algum. Talvez eu tenha pensado em algo parecido. Nah, eu pensei exatamente nisso. Fomos embora após trinta minutos de passeio e sem encontrar o negro calvo de mais ou menos trinta anos usando camisa vermelha com detalhes em preto nas mangas. Mas os policiais acharam o negro careca de mais ou menos vinte anos usando camisa regata branca e bermuda preta. Mas ele não tinha um celular samsung, só uma acusação por segurar um cara pra um outro bater. Nenhum desses dois tinha um celular samsung, nem o cara que apanhava e nem o que batia. Os meganhas me levaram pra delegacia, pra abrir ocorrência, mas não sem antes uma tentativa de me convencer de que eu é que era o culpado e que o ladrão só fez o trabalho dele. Assim que passei na porta da delegacia, me tornei em um ser invisível. E fiquei na invisibilidade por mais vinte minutos. Uns vinte e cinco. Trinta. Ok, guys, to aqui, não finjam que eu não existo. O problema é que eles não fingem que você não existe, antes fosse. Você existe, é real e está ali, atrapalhando a conversa. Eles te olham, você olha pra eles, eles olham uns para os outros e continuam a conversar sobre a Taurus. Mas o segredo é ficar imóvel, para não haver essas interrupções. Tente ignorar a dormência na perna. Assim o assunto acaba rápido e o sargento que usa aparelho nos dentes te atende num instante: Olha, aqui a ocorrência vai demorar, sugiro que você vá na polícia civil, que é mais rápido , é na hora. Ok. Muito Obrigado. Vou ali pegar um táxi na Avenida Paraná deserta. Mas sem medo, os policiais prometeram que ficariam me olhando até o táxi aparecer. Só não sabia que eles terminariam de conversar sobre a Taurus primeiro. O táxi veio rápido. O taxista foi bastante compreensivo e me ensinou que é preciso ter cuidado quando você vai chutar a cara de alguém, é importante usar o bico do sapato e não o peito do pé, assim você não se machuca com os dentes da vítima. E na hora que sentir que está chutando algo macio, é pra parar pois os dentes todos já caíram e não tem graça chutar gengiva. Um bom argumento, indeed, mas não consegui usá-lo no vestibular. Não ficaria bem dizer que o Stalin chutava a cara das pessoas até sentir o molinho da gengiva. O certo seria dizer que ele mandava alguém fazer isso por ele.
É. Foi isso.